Matéria de capa/ Foco no essencial: A estratégia central da Mondial e da Aiwa
Visão positiva, trabalho, disciplina e obstinação em atender bem o cliente levam a Mondial a ocupar importante lugar na indústria brasileira e a crescer além das fronteiras.
O dia começou bem cedo, às 5h30 da manhã. Seguimos para a raia da USP, em São Paulo, para encontrar um grande executivo brasileiro. Giovanni Marins Cardoso, cofundador da Mondial e agora do Grupo MK (detém as marcas Mondial e AIWA) cumpre essa rotina quase diariamente. Ele é remador do Corinthians e, faça chuva ou faça sol, inicia a prática do esporte, ao raiar do sol. Para o executivo, “remar é trabalhar em equipe”. Universidades americanas e europeias mantêm a prática de remo em seus currículos, traçando um paralelo do esporte com o mundo corporativo. Quando uma equipe trabalha em sincronia, com técnica, esforço, disciplina e foco, o resultado do conjunto é muito positivo.
por Igor Lopes
Acompanhamos 1h20 de treino. Depois, o executivo seguiu para seu escritório, onde mantém, diariamente, compromissos desde bem cedo até tarde. “O dia começa cedo, e não tem hora para terminar”, brinca. Ali, no showroom, com mais de 460 produtos de seu catálogo atual estrategicamente posicionados, conversamos sobre as origens da empresa, o crescimento médio de 33% ao ano, a expansão internacional e, acima de tudo, sobre ter a visão positiva do Brasil e do mercado.
O que o inspirou a fundar a Mondial? Como tudo começou?
GIOVANNI MARINS CARDOSO – Eu nasci em Palmas, uma pequena cidade do interior do Paraná. Estudei, sempre, em escola pública do interior. Minha mãe era professora, fato que me estimulava diariamente a estudar muito. Pelo meu pai, que era comerciante, o estímulo era para a responsabilidade e o compromisso do trabalho. Desde os meus dez anos de idade, já trabalhava no caixa e na área de compras do comércio que ele mantinha na cidade e aprendi muita coisa com isso. Depois do colegial, fui estudar em Curitiba. Fiz curso pré-vestibular e passei em Engenharia Elétrica em São Paulo e em Florianópolis. Optei por São Paulo, metrópole que sempre me atraiu, mesmo só conhecendo por foto. No terceiro ano da faculdade, participei de um concurso para estágio numa grande empresa multinacional alemã. Eram quinhentos e poucos candidatos para 16 vagas. Consegui passar e, pelo meu perfil, fui inicialmente para a área de marketing e depois passei para a área comercial. A coisa evoluiu, e fui trabalhar em uma empresa americana, que posteriormente foi comprada por grupos nacionais, internacionais, fundos, etc. Posteriormente foi comprada por uma empresa francesa, líder na Europa no segmento de eletroportáteis.
As multinacionais olham para o Brasil de uma forma diferente. Eles queriam trabalhar, praticamente, com a classe A. Como eu já entendia que o Brasil é um país de grandes oportunidades em todas as classes, A, B, C, D, resolvi criar a Mondial. Convidei o Alberto Baggiani, meu sócio até hoje, para compor uma sociedade. Já havíamos trabalhado juntos antes e ele possuía especialidade na área administrativa e financeira. E, desde o início, construímos uma empresa com excelentes bases gerenciais e de gestão.
A Mondial cresceu a passos largos. Na primeira edição da Eletrolar Show, seu estande tinha 9 m². Em 2024, 900 m². Isso está refletido nos negócios da empresa?
GMC –Começamos com um único produto, um ventilador de 30 centímetros produzido em um espaço de 1.000 m². Desde o início, com a visão de que existe oportunidade no Brasil para quem trabalha focado, fomos crescendo, lançando produtos, criando e ampliando estruturas físicas. Hoje, temos mais de 460 produtos em linha.
Acredito que qualquer brasileiro que procurar vai encontrar um produto Mondial em casa.
GMC – Na campanha com nosso embaixador Rodrigo Hilbert, destacamos exatamente esse ponto: “Você deve ter um Mondial em casa, pode procurar”. Nós temos, em média, quatro produtos Mondial por casa no Brasil. Fizemos investimentos pesados nos últimos anos. O nosso market share é crescente. Neste ano, vamos faturar mais de R$ 6,2 bilhões. Estamos entrando em novos segmentos e chegaremos a 8, 9, 10 bilhões, rapidamente. Somos competitivos e fazemos tudo de forma planejada, organizada e com estratégia.
Para manter market share é preciso investir, crescer e ter um olhar atento para o cliente. Como se desenha essa estratégia?
GMC – Trabalhando todo dia. O market share é consequência de um trabalho. Tem que ter estrutura, investir e saber o caminho que você quer tomar. E aqui dirigimos a empresa com mentalidade de fundador. Focamos, sempre, em entregar ao consumidor final o melhor produto e o melhor serviço ao lojista, seja ele um e-commerce, loja física, hipermercado, atacado. Nós gostamos de fábrica e de pessoas. Sempre falamos aqui: “menos espuma e mais essência”. Então, um lojista e/ou um consumidor que adquire um produto nosso, com certeza ficará muito satisfeito.
Quanto foi investido no último ano?
GMC – Só na fábrica da Bahia, contratamos obras e investimos mais de R$ 200 milhões em máquinas, moldes, equipamentos e ampliação. A capacidade industrial da companhia está crescendo em 76% neste Q4 de 2024. Isso é fantástico! Estamos entrando muito fortes em 2025. Só neste ano contratamos, até agora, 1.700 novos funcionários. Com isso, saímos de 5.500 para 7.200 colaboradores em menos de 12 meses. É um salto grande! Em dois anos, foram mais de 2.100 contratações. A empresa está pujante, segura, e o mercado é bom. Vamos crescer bem e esse progresso é muito gratificante.
Como é a relação com a comunidade onde está a fábrica da Mondial na Bahia?
GMC – Quando fomos à Bahia, buscamos uma cidade pequena para adotar. Estamos em Conceição do Jacuípe, mas muitos já estão chamando de “Mondiallândia”. Escolhemos um lugar onde a população é acolhedora e a mão de obra muito comprometida. Fomos crescendo e, hoje, temos uma fábrica e um centro de distribuição com 232.000 m² de área construída e 4.900 colaboradores diretos, que projetam 35.000 indiretos. A população da cidade tem aproximadamente 7,5 mil pessoas ativas, então mais de 60% delas trabalham na empresa. Para nós, é muito orgulho e, também, muita responsabilidade junto à região. Investimos na cidade e somos uma empresa apolítica, fazemos o nosso trabalho para o município. Ajudamos a reformar escolas, investimos em creches, além de aproximadamente R$ 200 milhões que ficam na região. A economia local está pujante, a cidade cresceu. Trouxemos desenvolvimento para o interior. Dessa forma, é possível manter o colaborador no seu local de origem. Estamos atentos, também, à questão social. Fazemos a nossa parte para melhoria da região.
Nesse investimento há muita tecnologia envolvida, como IA e IoT para as fábricas serem mais produtivas e ferramentas para o funcionário ter mais recursos. Como é o olhar do Grupo MK para esse tema?
GMC – Nós temos, hoje, mais de 180 injetoras que trabalham 24 horas por dia, 30 dias por mês, e a maioria delas já possui acessórios robóticos. Isso melhorou muito a eficiência da fábrica. Muitas operações de tampografia já são feitas por robôs. Existe também uma característica dos eletroportáteis, pois como possuem muitos componentes, precisam ser montados manualmente e essa função gera empregos. No escritório central, criamos um núcleo de inovação para fazer a integração da Inteligência Artificial (IA) de forma estruturada. Contratamos uma empresa que nos dá suporte. Por exemplo, fazemos um briefing do produto para a equipe de designers e fazemos, também, um briefing para a inteligência artificial. Depois, analisamos as ideias dos designers e da IA e escolhemos os melhores caminhos para o desenvolvimento dos produtos.
“Só na fábrica da Bahia, contratamos obras e investimos mais de R$ 200 milhões em máquinas, moldes, equipamentos e ampliação. A capacidade industrial da companhia está crescendo em 76% neste Q4 de 2024.”
Como o Grupo se posiciona em relação ao pós-venda?
GMC – O pós-venda nasce na engenharia, que desenvolve um produto de excelente qualidade. O primeiro desafio do pós-venda é criar produtos com qualidade para que não precise de ações de pós-vendas. Mas, mesmo assim, temos mais de oito milhões de componentes em estoque para prestar assistência técnica. Precisou de uma jarra de cafeteira de três anos atrás? Nós temos no estoque. Temos obsessão pelo atendimento de qualidade. Além do cérebro, nosso coração também está no negócio. Na premiação do MESC, que é um prêmio que ganhamos, por exemplo, tivemos a maior nota jamais dada em pesquisa de “cliente oculto”, onde os pesquisadores ligam para as empresas e simulam um consumidor. A nossa equipe de backoffice foi a que respondeu indicando todas as soluções. Eles perguntavam: “qual é o consumo da minha Air Fryer modelo X?”. O time respondia: “são tantos watts”. “Mas quanto vou gastar em reais?”. O atendente perguntava em que região o consumidor estava, consultava o CEP, tinha o preço da energia elétrica e informava o valor. O cliente oculto dizia que ia ficar com o sinal ruim por 10 segundos, porque entraria em um túnel fictício. Em geral, 80% dos atendentes desligam. Em nossa empresa, o atendimento continua normalmente. O nosso atendente ficava esperando e perguntava: “o senhor já saiu do túnel?”. Temos o DNA de atendimento e gostamos disso.
Imagino que deva ser necessário muito treinamento para isso.
GMC – Sim! Treinamento é importante, mas não somente ele. É a essência da companhia que está clara na atuação dos colaboradores. É a cultura de uma companhia que gosta de servir. Então, para nós, isso é natural. Temos a cultura de atender bem. Tem muita essência nesta empresa.
Vamos falar de AIWA. Como tem sido essa experiência do licenciamento da marca?
GMC – Internacionalmente, as empresas japonesas estão reduzindo muito a produção de televisão. Novos concorrentes entraram no mercado, foram competitivos e reduziram a participação das empresas japonesas. Portanto no Brasil, a Sony, de quem compramos nossa atual fábrica em Manaus, resolveu parar. Praticamente nos escolheu para assumir e dar continuidade a um legado de alta performance. Compramos e pagamos antes mesmo de visitar a unidade, porque sabíamos que era uma indústria ultramoderna e com DNA e cultura japonesa.
E de porteira fechada?
GMC – Sim, com tudo lá. A fábrica é excelente, mas a joia da coroa são os colaboradores. Contratamos os 222 funcionários que já trabalhavam nessa planta e, hoje, estamos com mais de 1.400. Seremos mais de 1.600 daqui a alguns dias. É mais responsabilidade, mas é muito gratificante. Estamos aqui para progredir. Com a compra dessa fábrica e o licenciamento da marca AIWA, entramos num outro território, o do entretenimento, com TV e som de alta fidelidade. Temos a marca Mondial, que possui linha de cozinha, lar, ventilação e cuidados pessoais. E a AIWA possui muita credibilidade em eletrônicos. Muitos consumidores, que tem acima de 35 anos, já tiveram um AIWA e com excelente lembrança.
Foi o meu primeiro diskman.
GMC – Olha aí, e você lembrou! Era bom? Era! Então, como compramos a fábrica que pertencia à Sony, nada melhor que ter uma marca que foi Sony. Todo mundo tem um carinho muito grande por AIWA, então licenciamos a marca. Vamos competir, principalmente, com as grandes multinacionais. E isso é bom! Gostamos de competir.
Qual é a estratégia global do Grupo MK, que vem crescendo além das fronteiras brasileiras?
GMC – Estamos com presença Mondial no Paraguai, Uruguai, Argentina, Bolívia, Guatemala e até nos Estados Unidos. Estamos indo bem, passo a passo. Nos Estados Unidos, inicialmente, entramos com produtos “Made in Brazil” para atuar no maior mercado do mundo e trazer conhecimentos de lá para nossas operações no Brasil.
Como estão os próximos passos?
GMC – Já compramos novas áreas na Bahia e estamos ampliando Manaus também. Temos, hoje, mais de 700 mil m² em área total e estamos escalando os negócios. Agora, além de portáteis, ventilação e cuidados pessoais, entramos em eletrônicos e linha branca de forma mais pesada, trabalhando com as duas marcas Mondial e AIWA. A nossa estratégia é estarmos atentos para todas as oportunidades.
Agora, vamos “apertar os botões” e escalar as possibilidades. Em portáteis, saímos do zero e alcançamos 40% de market share. Em eletrônicos, com TV, estamos com 6% e vamos trabalhar para chegar nos 10% ou 12% de share no próximo ano. Nos eletrônicos, com as caixas de som da marca Mondial, estamos com 28% de share. Isso é o que chamo de mentalidade de fundador que enxerga toda a estrutura, cuida do caixa, do cliente final, dos produtos, das vendas, do controle de custos, do pós-vendas, de todo o 360° da empresa. Esse tipo de mentalidade faz a empresa crescer bem e de forma positiva.
Que dicas você dá ao empreendedor que quer traçar um caminho de sucesso no Brasil, mesmo com os problemas do País?
GMC – Em 1º lugar, é preciso ter a visão positiva e das oportunidades reais do Brasil e acreditar muito nisso:
- País com 214 milhões de habitantes, grande mercado.
- Um único idioma.
- 79 milhões de residências com energia elétrica.
- Baixo índice de saturação de produtos.
- Bônus demográfico positivo até 2030.
- Vastas reservas de commodities minerais.
- Potencial de ampliação de área cultivável (celeiro do mundo).
- 78% de energia renovável proveniente do vento, luz e água.
- Modernização rápida dos canais de distribuição e vendas.
Em 2º lugar, é importante definir objetivos, pesquisar mercados e ter um plano de negócios.
E, por fim, focar em produto de qualidade com a melhor relação custo x benefício e vender.
Fonte: Eletrolar News ed. 164