ENTREVISTA EXCLUSIVA -Osmar Della Valentina, Grupo Gazin
por Leda Cavalcanti
Com 295 lojas no Norte, Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste, o Grupo Gazin registrou média de crescimento de 13,5% nos últimos 10 anos e faturamento de R$ 5,860 bilhões em 2020. Liderado por um varejo forte, é composto por 11 empresas e mais de 8 mil funcionários. E tem uma visão realista do Brasil e de suas diferenças sociais. “Não existe um padrão único, há pessoas que vivem na informalidade, trabalham por diária, sem registro e não têm cartão de crédito, então não conseguem financiamento na compra online. Há cidades onde o consumidor vai à loja fazer o carnê porque guarda o cartão de crédito para uma emergência”, diz o presidente e diretor comercial Osmar Della Valentina, há 25 anos atuando no grupo, para onde foi com a incumbência de montar o atacado, o qual gerenciou até 2011.
“O varejo continuará forte como sempre foi, porém com algumas mudanças. A combinação do físico com o digital é fundamental. Continuaremos melhorando nossos ambientes de loja. Os espaços físicos ainda são um grande meio de compras, inclusive como forma de lazer.”
O trabalho muito próximo ao fundador do grupo o credenciou a ser seu sucessor, o que ocorreu em 2014. Administrador de empresas com MBA em marketing e gestão, Osmar fala, nesta entrevista exclusiva para Eletrolar News, sobre os desafios do varejo em geral, das dificuldades enfrentadas pelos varejistas regionais e das expectativas para 2021. Em sua opinião, o grande desafio do segmento, no futuro, será a capacidade de se adaptar, com muita rapidez, ao que ainda não é conhecido, ou seja, à situação de momento. “Nem tudo o que funcionou em 2020 dará certo em 2021. Mesmo com grandes desafios, existem muitas oportunidades. Isso está relacionado à forma como vemos as coisas.”
Qual é a sua avaliação dos 55 anos de atuação da empresa?
Osmar Della Valentina – A Gazin, como outras empresas, teve nesses anos grandes oportunidades e, também, grandes desafios. As oportunidades foram aproveitadas, e tomamos todos os cuidados em momentos difíceis. Alguns pilares são fundamentais para nós. Ter sempre o cliente em primeiro lugar, zelar pelo bem-estar dos nossos funcionários, respeitar o patrimônio do acionista, manter bom relacionamento com todos os parceiros externos e ser uma empresa que contribui nas comunidades onde atua gerando empregos, pagando impostos ou realizando sonhos das pessoas através de diversas ações. Por cinco vezes consecutivas, a Gazin foi eleita a melhor empresa para trabalhar no Paraná, de acordo com o Instituto Great Place do Work.
Como é composto o Grupo Gazin?
ODV – São 11 empresas. Temos uma holding e três negócios principais, que são o varejo, o atacado, que vende produtos aos pequenos lojistas, e as indústrias (colchões e molas). Além disso, temos outros negócios que servem de suporte aos principais, como financeira – vendemos consórcio nas lojas, inclusive de eletrodomésticos. Temos, também, seguradora, agência de viagens, transportadora e posto de combustível. É um grande grupo, liderado por um varejo muito forte, com 8.644 funcionários e faturamento em 2020 de R$ 5,860 bilhões. Nossa média de crescimento é de 13,5% nos últimos 10 anos.
Em quais estados estão as lojas?
ODV – Contamos com 295 lojas nos estados do Acre, Amazonas, Bahia, Ceará, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraíba, Paraná, Rio Grande do Sul, Roraima, São Paulo e Tocantins. Temos 22 centros de distribuição, sendo quatro no Mato Grosso do Sul, sete no Mato Grosso, dois no Acre, um na Bahia, um no Pará, um na Paraíba, outro no Paraná, um em Goiás, três em Roraima e um em São Paulo. Nossas lojas são todas de rua, nenhuma em shopping. Nas médias e grandes cidades, elas estão no centro, porém atuamos muito fortemente nos bairros. Isso é uma política antiga da Gazin.
Dos produtos vendidos, quais os de maior representatividade?
ODV – Pela ordem, eletros, vídeo, móveis, informática, telecom, portáteis, lazer, utilidades domésticas e presentes, brinquedos, ventilação, climatização, áudio, colchões e estofados Gazin. As categorias de eletros, vídeo e telecom representam mais de 50% do faturamento.
Como foi criada a Gazin?
ODV – Mário Gazin, o fundador, aos 16 anos de idade, trabalhava em uma loja na cidade de Douradina, interior do Paraná. Quando soube da intenção do proprietário de vender o estabelecimento, enxergou uma excelente oportunidade de negócio, visão compartilhada por seu pai, Alfredo Gazin, que entregou o jipe da família e parte da chácara onde moravam em troca da loja. Em 13 de dezembro de 1966, começou a história da Gazin, com o trabalho de Mário e de seu pai, Alfredo. Seis meses depois, toda a família ajudava no negócio, que vendia de alimentos a granel até móveis. Em 1974, foi aberta a primeira filial na cidade de Eldorado (MS), gerenciada por Rubens Gazin, irmão de Mário. Em 1975, com as geadas que abateram as plantações de café, boa parte da população de Douradina migrou para o sul-mato-grossense. Em 1976, Jair, o irmão do meio, foi para Mundo Novo (MS) e instalou a primeira loja de móveis do município. O fundador pensava em ter apenas cinco lojas, uma para cada irmão, e cinco caminhões, mas os esforços de todos os integrantes e a vontade de empregar mais pessoas resultaram em novas inaugurações e contratações.
Como é gerir um negócio em regiões do País com culturas diferentes?
ODV – Apesar da tecnologia, temos vários “Brasis”, não existe um padrão único. Há cidades onde o consumidor vai à loja fazer o carnê e há pessoas que vivem na informalidade, trabalham por diária, sem registro, e são nossos clientes há mais de 10 anos. São pessoas que não têm cartão de crédito, então não conseguem financiamento na compra online. Elas procuram a segurança do varejo físico, inclusive porque, se tiverem cartão, este é guardado para emergências. Por isso, optam pelo carnê. Há cidades que não têm sinal de celular, em outras a internet não funciona bem e já entramos até em lugares que não tinham energia, a motor, mais um desafio a ser superado. Em gestão, fazemos um combinado da experiência dos mais velhos com a energia dos mais jovens. Isso tem ajudado na nossa evolução. A gestão é profissional. Sou presidente e diretor comercial do grupo e atuo com Ony Mauricio Churkin, diretor administrativo, e Luiz Aparecido Custódio, diretor financeiro.
Quais as dificuldades do varejo regional?
ODV – Ele tem algumas dificuldades frente ao nacional, que utiliza, por exemplo, a mesma precificação em todos os locais. O regional tem custo maior. Por isso, precisa ser competitivo, melhor no atendimento, na logística e na condição de pagamento. Mas o varejo regional tem vantagens: conhece a cultura local e oferece atendimento diferenciado. No nosso caso, não estamos só nas grandes cidades, então conseguimos ter relacionamento maior com os clientes. Isso faz a diferença.
O que diferencia a rede das demais?
ODV – Procuramos preparar nossas equipes tecnicamente e psicologicamente. Trabalhamos de forma simples e objetiva, valorizando o tempo de todos. Nosso principal negócio é a loja física, porém atuamos digitalmente muito forte dentro dela, tanto que 100% dos nossos vendedores utilizam o tablet para vender desde 2013, o que torna o processo ágil e produtivo. Financiamos 80% das nossas vendas no crediário próprio, 90% dos clientes têm limite aprovado, e o tempo de espera é zero.
Como o senhor analisa a atuação do varejo em 2020? Quais foram os principais avanços?
ODV – O ano começou bem, mas com a chegada da pandemia houve momentos difíceis, como lojas fechadas em parte do segundo trimestre. A partir do mês de junho, houve melhora. Como as pessoas deixaram de sair, não gastaram com a manutenção do automóvel e voltaram o olhar para os produtos que queriam ter em casa, como notebooks. Alguns itens chegaram a faltar. No fim, foi um ano espetacular, com expectativa de crescimento de 26% a 27% sobre 2019. Quanto aos avanços, os principais foram a melhoria de processos, a produtividade e o uso da tecnologia nos negócios.
E o que deve ser melhorado?
ODV – É preciso tornar os ambientes de lojas cada vez mais confortáveis para todos sentirem-se bem. Duas novas lojas estão sendo preparadas para ter um café, uma espécie de área de lazer. Também montamos duas usinas solares, em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, para instalar ar-condicionado na unidade de Bela Vista (MS) e Sinop (MT). Nossa ideia é climatizar a totalidade das lojas. Por outro lado, nossa luta é por baixar custos, despesas, e melhorar a qualidade do nosso atendimento, tornando a empresa cada vez mais competitiva no caminho para o seu centenário.
A pandemia deixou lições para o varejo?
ODV – A principal lição que a pandemia nos trouxe foi aprender a mudar muito rapidamente, jamais perdendo a esperança. Para nós, não foram as grandes mudanças que fizeram a diferença, mas sim a velocidade com que foram feitas.
Em sua opinião, qual é o futuro do varejo?
ODV – O varejo continuará forte como sempre foi, porém com algumas mudanças. A combinação do físico com o digital é fundamental. Continuaremos melhorando nossos ambientes de loja. Os espaços físicos ainda são um grande meio de compras como forma de lazer, inclusive. Mas também vamos com passos firmes para o digital, buscando, cada vez mais, um entrosamento melhor entre os canais. A nossa plataforma, que começamos a criar em 2018, evoluiu muito em 2020, cresceu 180% na comparação com o ano anterior, e em 2021 o aumento esperado é de 100%. Acredito que as lojas físicas continuarão existindo, serão um apoio ao e-commerce. O que diferencia ambos é o atendimento e a confiança. Percebo, ao longo dos anos, que as pessoas gostam de visitar um bom ambiente. Independentemente de classe social, o consumidor atual quer ter produtos bons e com preço justo. É uma mudança de comportamento.
“A principal lição que a pandemia nos trouxe foi aprender a mudar muito rapidamente, jamais perdendo a esperança. Para nós, não foram as grandes mudanças que fizeram a diferença, mas sim a velocidade com que foram feitas.”
Como a Gazin se prepara para enfrentar os futuros desafios do varejo?
ODV – Sempre procuramos ser uma empresa sólida com liquidez. Mantemos como diretriz número um “o cliente em 1º lugar”. Buscamos promover um ambiente de trabalho saudável e feliz. Assim, melhoramos também os ambientes de compra. Acredito que o grande desafio será a capacidade de adaptação com muita rapidez ao que ainda não é conhecido, à situação de momento. Com isso, é grande a possibilidade de sucesso.
Quais os grandes problemas que o Brasil ainda precisa enfrentar?
ODV – O excesso de burocracia é um deles. É difícil, por exemplo, conseguir alvará de uma autarquia se não há nela pessoas comprometidas. Infraestrutura e educação são outros grandes desafios.
O que o senhor espera de 2021?
ODV – Há várias questões pela frente, a começar pela pandêmica. Não se sabe se o que funcionou em 2020 dará certo em 2021. Há muitas incertezas, mas é certo que a iniciativa privada terá um grande papel no País. Vamos esperar o primeiro trimestre. Temos que ver como o governo vai se comportar e como os investimentos estrangeiros virão ao Brasil. Precisamos ser mais cautelosos no nosso projeto. Vamos investir 1% do faturamento, como fazemos anualmente. Mesmo com grandes desafios, existem muitas oportunidades. Isso está relacionado à forma como vemos as coisas. Sou otimista. Na Gazin, olhamos mais para as oportunidades do que para as dificuldades.
Fonte: Revista Eletrolar News ed. 140